segunda-feira, 30 de outubro de 2017

As vertigens da razão: aula de Franklin Leopoldo.

Por Rosa Amélia (análise)
https://www.youtube.com/watch?v=S8j7ojLpZNI (acessado em 18/08/2017)

A aula do professor Franklin Leopoldo e Silva, publicada no Youtube, sob o título As vertigens da razão, apresenta, na verdade, uma analogia entre o pensamento de dois grandes filósofos, os quais, mesmo estando tão separados temporalmente, revelam-se muito semelhantes quanto às ideias, aos fatos políticos e sociais,  as lutas ideológicas pelas quais passaram: Pascal, que viveu no século XVII e KierKegaard, que viveu no século XIX. O professor começa justificando porque se pode associar esses dois grandes pensadores: tanto um quanto o outro entendem que o ser humano não tem condições de alcançar a verdade acerca das coisas e acerca de Deus, porque é insuficiente, pequeno e medíocre diante da grandeza e da perfeição do Universo. Acrescenta que tanto um quanto o outro foram religiosos fortemente ligados à fé cristã. Avança, na reflexão, resumindo o pensamento de Pascal e depois de Kierkegaard.
O primeiro foi contemporâneo de Descartes, viveu sobre a pressão do racionalismo, a partir da ideia de que não havia nada que o pensamento racional não pudesse alcançar.  Perguntas e questões fundamentais acerca do homem e de Deus deviam, nessa perspectiva, ser respondidas de forma racional. Nesse período, construiu-se uma autonomia humana em busca das verdades. Tal autonomia foi questionada por Pascal, uma vez que ele acreditava que alguns mistérios acerca da condição humana eram/são irrespondíveis a partir da racionalidade.
Acreditar que tudo, inclusive o mistério, possa ser respondido pelo viés da razão revela um recuo da razão, que não é tão suficiente assim. Para Pascal, nas palavras do professor Franklin, o homem se constitui de um corpo/matéria e um espírito/alma/essência, os quais constituem a realidade humana e não podem ser explicados pela racionalidade. Essa dualidade humana não pode ser compreendida pela mesma via. Tal fato revela a falibilidade, a insuficiência humana que se manifesta no existir. Sendo Deus perfeito, ele não pode ser alcançado e compreendido pela existência humana, que é limitada, insuficiente, contraditória e complexa. Deus, para Pascal, só pode ser sentido, compreendido, pelo homem, a partir da perspectiva do coração.
O segundo, KierKegaard, foi contemporâneo de Hegel e também foi um pensador, filósofo e religioso. Acreditava que a compreensão do ser humano, em suas questões existenciais, só poderia advir no plano da singularidade. O ser humano, afastado da sua essência, daquilo que o compõe enquanto espírito, não consegue, pela razão, alcançar os conceitos universais acerca da criação e de Deus. O afastamento da essência divina representa uma dificuldade de que o homem compreenda questões fundamentais que o atormentam: a criação, o pecado, o mundo, o ser, o existir. Assim, o homem só pode compreender tais questões pela via particular, a partir do vínculo entre ele e Deus.
KierKegaard, segundo Franklin, acredita também que o abismo existente entre Deus e o homem advém da ideia de pecado, da corrupção humana. Deus se distancia do homem em decorrência de sua condição pecadora, corrupta, devido à sua existência singular e finita. Disso nasce no homem o sentimento de angústia, que é gerado pela indeterminação humana, pois, ao distanciar-se de Deus, o homem perde a sua essência. Nesse sentido, a fé, que é um sentimento ligado ao coração e não à razão, é a forma pela qual o homem tenta compreender as questões fundamentais humanas e busca unir-se ao divino, uma vez que se entende que a lógica racional não pode esclarecer o que compõe o humano. A racionalidade não pode explicar as questões que afligem o homem.
Considerando as ideias do professor Franklin e o título que ele dá à aula, As vertigens da razão, observa-se que, pela escolha da palavra vertigem, que significa, entre outras coisas, “sensação de movimento oscilatório ou giratório do próprio corpo ou do entorno com relação ao corpo”, ele também reconhece que há uma oscilação na  forma de pensar desses dois filósofos, primeiro porque eles destoam de tudo o que prevalece à época enquanto lógica racional na busca do entendimento humano; segundo, porque há uma oscilação na própria construção de suas concepções filosóficas entre o racional e o passional, entre a lógica e o sentimento, entre razão e a fé.
Isso, com certeza, não diminui a grandiosidade desses dois pensadores. Eles, apenas, trouxeram à tona, em séculos diferentes, aquilo que tanto atormenta o homem: a necessidade de compreensão de sua origem, da criação; o entendimento das questões fundamentais humanas, por exemplo, quem somos, para onde vamos, por que aqui estamos. Destaca-se que o professor Franklin expõe de maneira didática, bastante pedagógica, levando o expectador a compreender os pontos de intersecção entre os dois pensadores e, sobretudo, mostrando o quanto estas reflexões ainda estão presentes, mesmo depois de tantas descobertas científicas; mesmo depois de tanto avanço na ciência, o homem ainda não conseguiu compreender Deus, o Universo e as suas angústias existenciais . Será que um dia ele consegue? Compactuo com Pascal e Kiekegaard, o homem é muito limitado para compreender algo tão grandioso quanto é a essência divina e o universo. Ele não consegue compreender a si mesmo. Imagina Deus que transcende a natureza humana?


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